Análise de Assassin’s Creed Mirage — Resistiu ao teste do tempo? — Review

Mirage é o mais recente título da famosa série Assassin’s Creed da Ubisoft que já conta com diversos títulos e que se tornou ‘atemporal’ na medida em que não tem necessariamente um momento do tempo, mas que consegue adequar-se facilmente a qualquer periodicidade da história pré-medieval, medieval, moderna ou até contemporânea.

Esta é uma série que tem passado por momentos de altos e baixos e com isso, ditado a maior ou menor adesão a novos públicos, porém, algo inegável é a vasta coletânea de aficionados que tem vindo a acumular ao longo de quase duas décadas. Mirage tem tudo para ser um dos melhores desta geração de consolas — permitindo não apenas uma boa história como um ótimo equilíbrio entre grafismo e jogabilidade.

Este é um jogo ambientado em Bagdade no século IX, no auge da era do ouro, onde nos deparamos com a existência de uma sociedade apelidada de ‘Ocultos’ — uma ordem secreta de assassinos profissionais — e em que Basim Ibn Ishaq se vê envolvido depois de mostrar interesse na organização. Basim enfrenta um desafio enorme, liderar o combate conta os Templários, ou seja, contra a ‘Ordem dos Anciãos’ (o termo para descrever a ordem).

Narrativa — promissora mas ofuscada pela desconectividade temática

Mirage marca o regresso da Ubisoft às origens e presenteia-nos com um regresso à era dourada do século IX, onde vagueamos pelas ruas empobrecidas de Bagdade sobe o comando de Basim — um individuo que faz vida do roubo por esticão e organizado sob encomenda — que procura melhores condições de vida e que vê nos ‘Ocultos’ (uma sociedade secreta de assassinos) uma oportunidade para melhorar a sua condição económica (e da sua gente) aproveitando a sua proficiência no ramo do assassinato profissional.

Em uma época que a Ordem dos Templários se expandia pelo Médio Oriente, os Ocultos procuravam lidar com os ‘Anciãos’ (vulgos Templários no jogo) para libertar da Bagdade desta ordem ocidental. Basim encara isto como uma ameaça ao seu povo e junta-se à sociedade secreta (que protegia a atual capital Iraquiana).

Ainda que esta seja uma história um pouco difícil de acompanhar, Basim começa como um mero iniciante e vai evoluindo ao longo da narrativa dentro da organização até chegar a ‘Mestre Assassino’ dado a sua aptidão para este tipo de atividades pelas ruas de Bagdade, sabotando, eliminando e roubando o que lhe é solicitado por intermédio de missões principais e algumas atividades secundárias. Falamos de um jogo estilo RPG de mundo aberto — que tem sido a mais recente abordagem da Ubisoft para a série — mas que funciona bastante bem.

Em termos de imersão, este jogo presenteia os jogadores com alguma interação com o mundo que o rodeia, pelo menos, em jogabilidade, no entanto, quando falamos da história, a desconexão de algumas missões faz com que nos deparemos com cortes narrativos que não explicam certos momentos do tempo e em que não sentimos que as nossas ações tenham algum impacto significativo.

Tirando estes aspetos negativos, este é sem dúvida uma história digna de ser vivenciada, sobretudo, para quem gosta um pouco de ficção misturada com história (como eu) e que consegue abstrair-se e imaginar o que seria aquela civilização, formas de viver, de pensar e de como evoluiu até aos dias de hoje com as suas virtudes e defeitos — como em todas as civilizações.

Ambientação — um espetáculo visual e cultural!

Inspirado numa típica cidade islâmica, Mirage, envolve-nos num enredo pelas ruas estreitas e emblemáticas de Bagdade. Ao contrário dos antecessores, este novo título oferece um espaço cénico de menores dimensões quando comparados com os seus contemporâneos e demonstra também que segue numa trajetória contrária aos seus homólogos. Isso também se refletiu no preço — mais isso falamos mais à frente — e ainda bem!

A ambientação é importante num jogo pela possibilidade de envolver o jogador na ação e na narrativa que é apresentada. Para quem conhece e sente nostalgia de títulos como Black Flag ou Sydicate, este não será um jogo que passa despercebido, no entanto, pode não ser suficiente para o superar — provavelmente apenas ao nível da qualidade de imagem.

Mirage marcam também o regresso do foco na furtividade e no stealth parkour que tão bem marcou toda uma geração que via no AC uma hipótese e uma liberdade de abordar o jogo que não vemos em diversos jogos que seguem este estilo RPG. Para além disso e apesar de Bagdade (no jogo) ser consideravelmente mais pequena do que em outros títulos, consegue disfarçar de uma forma inteligente, povoando-a de forma parecer bastante mais vasta do que realmente o é.

Isto tudo conseguido graças à presença de uma cultura muçulmana que tantos progressos e benefícios trouxe à sociedade ocidental. A beleza intrínseca da arquitetura dos palácios e até das habitações mais simples para a época é, simplesmente impressionante e, arrisco-me a dizer, capaz de entusiasmar qualquer um. O vestuário, os artefactos e até alguns dos ‘easter-eggs’ presentes no título perpetuam aquela que tem sido a trajetória extremamente positiva da série.

Para quem se dedica a explorar este mundo aberto de Assassin’s Creed Mirage, saiba que poderá encontrar mercados movimentos, espaços de oração e música. É uma cidade animada em toda a sua essência. Enquanto nos distraímos com estas interações e pequenas interpelações que o nosso ladrão ‘Basim’ faz no negócio do ‘carteirismo’ afasta-nos da ideia o facto de estarmos num jogo mais pequeno — que deverá assentar numa ótica de expansões pagas (visto que a versão base é mais barata do que a maioria dos AAA contemporâneos).

Ainda que não seja perfeito — sobretudo se comparado com os seus antepassados mais longínquos — é um sinal positivo da trajetória que a Ubisoft está a seguir no sentido de voltar a uma casa (um tempo) onde foi tão feliz. Em uma altura que a IA está alterar o paradigma de quase tudo o que nos rodeia, também a equipa de desenvolvimento aproveitou a sua experiência para tornar os NPCs um pouco mais inteligentes e motores para um causa efeito evidente na narrativa do jogo.

Qualidade gráfica — digladia-se entre desempenho e qualidade

Entre tantos pontos positivos, será talvez no requisito gráfico que o Mirage desaponta um pouco — dado que falamos de um mapa de menores dimensões — pela modesta performance do motor gráfico e de texturas do título. A maturidade do aproveitamento da atual geração de consolas é visível, mas parece que ainda não alcançaram a otimização desejada — quem sabe se por terem optado por manter o jogo para esta e a anterior geração.

Nós tivemos oportunidade de analisar o jogo numa PlayStation 5, no entanto, analisando outros artigos similares, tivemos a oportunidade de chegar a conclusões similares e perceber que nas três plataformas (PS5, Xbox Series X e PC) a nível gráfico estão equilibradas sem apresentar grandes diferenças. A Series X, apesar de oferecer um poder de processamento mais elevado, tem idêntico ou muito pouco melhor que a sua homóloga da Sony. Aliás, em algumas situações, a PS5 destacou-se no processamento graças à combinação tecnológica de gestão de potência entre GPU e CPU.

Existem dois modos gráficos, o modo de desempenho que permite 60 fps, de um modo geral, estável, mas que pode ocasionalmente ser afetado pela sobrecarga do motor gráfico. De um modo geral, cumpre os objetivos, no entanto, com prejuízo de algumas texturas, mas sobretudo ao nível da resolução — oscilando entre 1940p e 1620p — e da sensação de profundidade em algumas das texturas. Porém, quando passamos para o modo de qualidade bloqueia em todas as plataformas a 30 fps, conseguindo manter em 3840×2160.

Não fosse necessário reiniciar o jogo (pelo menos, na PS5) de cada vez que queremos mudar o modo gráfico — coisa que não acontecia (se bem me recordo) com o Horizon Forbidden West, exclusivo PlayStation — quase que seria mais interessante cada vez que houvesse cutscenes, vê-las no modo de qualidade (porque seria quase como se estivéssemos a ver um filme) e colocar o modo performance para a gameplay normal, sobretudo em combate.

Jogabilidade — o domínio da arte do parkour e da furtividade!

Falar de Assassin’s Creed sem falar do parkour ou da imersividade do stealth é o mesmo que falar de Gran Turismo sem falar dos seus pormenores mais técnicos que diferenciam cada máquina que temos ao dispor para nos fazermos ao asfalto. Evidentemente, cada um com os seus detalhes mais específicos, mas todos eles com dividem opiniões nos temas mais suscetíveis de cada uma destas obras-primas.

Em Mirage, explorar Bagdade torna-se extremamente gratificante dada a forte presença de cordas, pranchas, varandas, telhados e outras plataformas suspensas que permitem transformar a cidade no espaço cénico ideal para fazer parkour e observar a movimentada vida num dos pontos mais icónicos da religião islâmica. Aliás, torna-se quase tão importante vaguear por entre telhados como perceber o contexto cénico que é dado pelas personagens com as quais contactamos ao longo da narrativa.

Ao contrário de anteriores títulos da série, em Mirage, existe uma procura bastante intensa de invocar as origens de Basim — um ladrão profissional do século IX — em recorrer às suas técnicas mais furtivas e do disfarce para evitar o confronto direto com múltiplos inimigos. Este é um jogo para quem gosta de fazer frente aos seus inimigos de forma mais dissimulada, evitando ao máximo dar nas vistas. Em confrontos 1 vs. 1, ou mesmo, 1 vs. 2, a facilidade com que derrubamos o inimigo é tão estonteante como quase perversa — visto que é quase um insulto aos guardas que são knock-out sem grandes dificuldades.

Porém, já no confronto direto com mais de um inimigo, pelo menos, no início da campanha, senti alguma dificuldade em enfrentar mais que dois inimigos no confronto direto, sendo forçado na maior parte das vezes a fugir ou procurar esconder-me até me perderem o rasto sobe pena de ser assinado pelas sucessivas investidas quase impossíveis de defender dos inimigos. Não faltam são habilidades e objetos que permitem ofuscar ou mascarar a sua presença aos olhos dos inimigos para na primeira oportunidade, os poder eliminar um a um sem grande dificuldade.

Como era expectável, num jogo mais furtivo, os gadgets que tem à sua disposição variam entre pequenas armas brancas, armadilhas e dardos tranquilizantes que vão sendo alvo de melhorias e personalizações com os materiais que são descobertos em pequenas caixas, baús e cestas que vamos encontrando ao longo do mapa, já para não falar nas moedas que vamos acumulando nos nossos roubos ao estilo carteirista (ex: pick-pockets) ou que vamos encontrando enquanto vasculhamos estes objetos.

Por falar em moedas ou tokens (como é referido no jogo), o sistema de pagamentos no jogo agrupa-se em três tokens (ou moedas de pagamento): Merchant token, Power token e Scholar token.

A primeira moeda, como o próprio nome indica, serve como forma de pagamento aos mercantes e lojistas, sobretudo aos alfaiates e ferreiros permitindo descontos até 30% se forem oferecidas três deste seu token favorito.

A segunda moeda — Power token — é utilizada como forma de obter poder na medida em que permite pagar a mercenários para eliminarem alguns dos seus inimigos ou como forma de distração numa entrada mais dissimulada, no entanto, pode ser também utilizada como forma de suborno aos oficiais do califado — os Munadi — que propagandeiam os avisos comunitários em Bagdade.

Finalmente, a terceira moeda — token académico (se traduzido à letra) — serve como forma de pagamento a músicos e outros estudiosos que permitem que se misture com maior eficiência no meio da multidão ou como forma de ‘encantamento’ a fim de atrair guardas e outros inimigos.

As armas, por exemplo, podem ser reforçadas para cortar uma armadura mais reforçada, permitindo que consiga derrubar furtivamente até os inimigos mais fortes, ou até em alguns casos, cobri-los com um material corrosivo, o que significa que eles poderão até dissolver os corpos de inimigos mais fracos sem deixar vestígios para que não sejam encontrados.

Em Mirage, não há uma penalização gravosa como perder uma determinada missão por ser descoberto (na maioria, mas não em todas), no entanto, há consequências mais do que imediatas em ser descoberto. Nós, enquanto Basim, podemos ser denunciados por cidadãos que assistam às nossas atividades ilícitas sendo denunciados aos guardas da cidade — com as consequências que daí advêm.

À medida que a notoriedade de Basim sobe, a cidade torna-se mais perigosa — é o preço a pagar por uma fama que o precede — a cada conquista e evolução bem sucedida na derrota da Ordem dos Templários. Os cidadãos irão reconhecê-lo com maior facilidade enquanto se tenta misturar entre as multidões. Além disso, também os caçadores de recompensas irão persegui-lo por toda a cidade — o que torna a experiência ainda mais tensa, mas imensamente gratificante de cada vez que nos livramos da ameaça.

Não obstante esta postura de alerta e, por vezes, mais agressiva, reconheço que a inteligência artificial dos NPCs ainda é bastante singela e que ainda merece maior aperfeiçoamento no futuro — sobretudo para quem jogar no modo mais fácil, visto que já sinto isso num modo de jogabilidade moderada. É rara a situação em que nos deparamos com reações bem pensadas por parte dos inimigos — de todas os momentos em que perdi um combate corpo-a-corpo foi por me armar em campeão de artes marciais e acabar eliminado por meia dúzia de ‘espadadas’ no corpo.

Dito isto e reforçando o que já foi dito, apreciei a estrutura de cada missão que incentiva uma abordagem definitivamente mais furtiva aos obstáculos que encontramos em cada edifício inimiga. Todavia, o custo de termos mecânicas furtivas mais desenvolvidas, é um sistema de combate corpo-a-corpo que, enquanto aceitável, está longe daquilo que seria desejável e que, inclusivamente já vimos nesta série.

Veredito

Assassin’s Creed Mirage é o reaparecimento da série numa altura em que completa quinze anos. Depois de dois títulos centrados no combate corpo-a-corpo, Mirage retoma o estilo furtivo que tanto o caracterizou no passado. É claro que não faz tudo bem, em todo o caso, é uma abordagem mais cautelosa, mas interessante face ao desempenho da série.

Acima de tudo, o que há a ter em mente é que é um jogo de uma escala diferente — Mirage pode demorar entre 17 e 20 horas para ser completado, enquanto Odyssey e Valhalla demoravam quase 100 horas — e também o preço acompanhou esta diferença. Enquanto um novo jogo para consola se situa nos 79,99€ e, no PC, nos 69,99€; o novo AC Mirage está a ser vendido por 49,99€ em todas as plataformas na sua versão padrão. Esta parece ser a estratégia da Ubisoft para chegar a novo público, mas também observando que podem ser obtidos alguns ganhos com a compra de extras.

Embora não existam aqueles momentos de espetacularidade de outros títulos, Bagdade é uma belíssima cidade por si só, e isso já torna toda a experiência enriquecedora e cativante. Recorde-se de jogos como o primeiro Watch Dogs que oferecia toda uma experiência divertida e moderna, no entanto, o semblante de Chicago acabava por cortar um pouco do entusiasmo dada a escuridão que a caracteriza. Bagdade em Mirage não é assim e isso é um ponto bastante favorável.

Ainda que subliminarmente, Mirage suscita alguma curiosidade em torno de uma misteriosa conexão entre Basim do novo título a Valhalla. Mas, neste caso, a solução para este mistério é pouco conclusiva e parece um tanto quanto forçada — ainda que seja interessante, sobretudo para quem jogou o título anterior. À parte disto, como se costuma dizer, por vezes ‘menos é mais’ e a Ubisoft parece ter levado esta conclusão bastante a sério baseando-se na premissa que menos horas de narrativa e a de que maior simplicidade no conteúdo in-game permitiram um resultado superior ao obtido nos anteriores títulos.

Por fim, gostaria ainda de agradecer a disponibilização do código para avaliar Assassin’s Creed Mirage em meu nome e do Mais Tecnologia à Ubisoft Spain que permitiu a realização desta análise sucinta de um jogo que teria, certamente, muito mais para se escrever. Este é por certo um jogo que recomendo ao novo público que nunca jogou Mirage — mesmo sem o contexto dos anteriores — mas, sobretudo, à comunidade que segue de perto a série.

REVER GERAL
Narrativa — promissora mas ofuscada pela desconectividade temática
7.7
Ambientação — um espetáculo visual e cultural!
10
Qualidade gráfica — digladia-se entre desempenho e qualidade
8.9
Jogabilidade — o domínio da arte do parkour e da furtividade!
9.3
analise-de-assassins-creed-mirage-resistiu-ao-teste-do-tempo-reviewMirage, o mais recente título da Ubisoft, mergulha os jogadores nas ruas estreitas e icónicas de Bagdade do século IX, oferecendo uma experiência única de parkour e furtividade. Embora a ambientação seja visualmente cativante e a imersão na cultura islâmica seja notável, o jogo revela algumas desvantagens na qualidade gráfica. Enquanto a trama é enriquecida por uma busca por livrar Bagdade do jugo dos Templários, Basim opta por abordagens furtivas e evita confrontos diretos, contra uma IA dos NPCs que neste jogo deixa um bocado a desejar. Mirage oferece uma variedade de moedas e a oportunidade de melhorar armas e equipamentos, tornando o jogo atraente para quem procura uma experiência de furtividade mais gratificante. Todavia, algumas questões gráficas e de jogabilidade ainda precisam ser melhoradas, tornando o jogo num equilíbrio entre virtudes e desafios a serem considerados no futuro da série.

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